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Depois de um mês de investigação em virtude a ação impetrada pela coligação, “Unidos para o Progresso”, sob o argumento de prática de atos de abuso de poder político e econômico, bem como captação ilícita de sufrágio pelos Representados, visando lograr êxito em campanha eleitoral, o juiz eleitoral da cidade de Macururé, Dr. Cládio Santos Pantoja Sobrinho, cassou os mandatos da prefeita e vice da cidade, Silma Eliane Adriano do Nascimento Carvalho e Renato Soares de Moura.
Em sua sentença, o Juiz, Dr. Cládio Pantoja, escreveu que: “Alega a coligação Representante que a primeira Representada procurou a eleitora Iza Alves da Conceição, em sua residência, na data de 05 de agosto de 2012, oferecendo-lhe enxoval e um emprego na Prefeitura em troca de voto, informando, também, que o seu nome já estava na folha de funcionários temporários da Prefeitura.
Segue aduzindo que este não foi o primeiro contato da Denunciada com a eleitora, uma vez que esta já havia sido procurada por telefone, no final do mês de julho, por uma assistente da Investigada de prenome Tatiana, e, após, pela Secretária de Educação Senhora Otacília.
Assevera também a coligação Representante que, conforme declaração de próprio punho da eleitora de fls. 16 a 17, a Denunciada pediu o voto da eleitora em questão e o de sua família, alegando que somente com ela (Investigada) no poder municipal conseguiria realizar os seus sonhos e que ela (eleitora) deveria pensar no futuro de seus filhos.
Informa, ainda, que, no dia 11 de agosto de 2012, a eleitora Iza recebeu nova ligação do Senhor Amauri comunicando a realização de um depósito na sua conta, sustentando a coligação a Denunciante a caracterização de desvio de recursos públicos para a captação de votos, bem como improbidade administrativa e o abuso de poder político e econômico.
Afirma a coligação representante que após esse contato telefônico, a eleitora teria dirigido-se ao caixa eletrônico onde verificou um depósito em sua conta corrente no valor de R$ 411,75 (quatrocentos e onze reais e setenta e cinco centavos) realizado pela Prefeitura Municipal de Macururé e que a eleitora confirmou, também, que seu nome constava na lista de contratados sem qualquer descrição de cargo ou função”.
Prossegue a representação asseverando que a eleitora informou categoricamente não ter assinado contrato com a Prefeitura Municipal de Macururé e que não trabalha na Prefeitura desde 2010.
A parte Autora junta aos autos, com o desiderato de comprovar suas alegações, vários documentos dentre os quais destacam-se: extrato da conta pessoal da eleitora às fls. 18, bem como lista dos servidores municipais da Prefeitura de Macururé, referente ao período de junho/2012, de fls. 77 a 90, onde às fls. 82 consta o nome da eleitora entre os seus funcionários.
Por tudo exposto, requereu a Representante, como pedido principal, a cassação dos registros de candidatura ou dos diplomas dos Investigados, bem como multa no valor legal prevista nos §§ 4º e 5º do art. 73 da LC nº 9.504/97.
Requereu, também, a condenação dos investigados a ressarcir o erário municipal pela prática de improbidade administrativa, nos termos do § 7º do art. 73 da LC nº 9.504/97.
Devidamente notificados nos termos da Lei Complementar nº 64/90 (fls. 94 e verso; 96 e verso), os Investigados apresentaram, individualmente e tempestivamente, as suas contestações de fls. 99/106 e 110/113.
A primeira Investigada Silma Eliane Adriano do Nascimento Carvalho, em sua defesa, contesta os fatos narrados na exordial, alegando que, de fato, a eleitora Iza foi efetivamente procurada em junho de 2012 pela Secretária de Educação para suprir lacuna naquela secretaria, uma vez que a mesma já havia prestado serviços na Prefeitura até dezembro de 2010.
Segue aduzindo em sua peça de bloqueio que a contratação só não foi realizada em razão do adiantado estado de gravidez da eleitora e que, por um lapso do departamento de pessoal, o nome da eleitora foi indevidamente incluído na folha de pagamento de junho/2012 e o salário foi pago em agosto/ 2012.
Informa ainda a primeira Investigada que, detectada a falha, o controle interno iniciou o procedimento administrativo para sanar a irregularidade e apontar os responsáveis, asseverando que este fato não tem relação com qualquer ilícito eleitoral e que a visita da candidata à residência da mãe da eleitora foi realizada como ato legítimo de campanha, quando a candidata pediu votos, informando os seus planos de governo e tentando licitamente convencê-los a votar nela, como fez em toda a vizinhança.
Alega também a Investigada que não houve qualquer condicionamento do voto a cargo público ou mesmo a enxoval, nem qualquer proposta dessa natureza e que o diálogo relatado na inicial é mero ato regular de campanha. Aduz que a coligação Autora pretende aproveitar mero erro ocorrido na Prefeitura para distorcer os fatos e imputar falsamente ilícito inexistente.
Argumenta ainda a Investigada que o fato não pode ser caracterizado como captação ilícita de sufrágio, uma vez que o art. 41-A da Lei 9.504/1997 determina que o fato somente afigura-se como típico quando ocorrido a partir do registro da candidatura até o dia da eleição, e tendo o mesmo ocorrido em junho não está enquadrado na hipótese legal.
Ratifica a Representada a ausência de dolo na sua conduta ao realizar visita com o fim de angariar votos para sua campanha, na medida em que a própria eleitora informa que a Investigada teria afirmado que a ajudaria independentemente do voto.
Requereu, ao final, a impugnação da declaração feita de próprio punho pela eleitora, como também das folhas de pagamento juntadas aos autos, pleiteando a improcedência da ação.
O segundo Investigado Renato Soares de Moura, por sua vez e em sua peça de defesa, reitera os termos apresentados pela primeira Investigada, alegando: a ocorrência de mero equívoco na inclusão da eleitora na folha de pagamento da Prefeitura, a abertura de procedimento administrativo para apuração dos fatos ocorridos, o ato lícito de captação de votos para campanha eleitoral, a ausência de dolo e a inexistência de fato típico, requerendo, ao final, a improcedência da ação.
Ressalte-se que ambas as peças de defesa apresentam rol de testemunhas, mas não juntam aos autos qualquer tipo de documento.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento com oitiva de testemunhas às fls. 148/157. A audiência foi suspensa em razão da grande quantidade de testemunhas ainda a serem ouvidas, tendo continuado às fls. 163/176.
Conforme requerido em mesa de audiência e deferido pelo MM Juízo, foi expedido Ofício nº 195/2012 pelo Cartório Eleitoral para cumprimento das diligências solicitadas, sendo juntado pela Prefeitura de Macururé o Processo Administrativo Disciplinar de nº 001/2012 de fls. 261/288, documento de arrecadação municipal no valor de R$ 411,75 (quatrocentos e onze reais e setenta e cinco centavos) de fls. 289, Relatório de Folha Analítica referente ao mês de junho/2012 de fls. 290/337, Ofício nº 54/2012 expedido pela Coordenadora Geral do Programa Pró-letramento/Bahia da UNEB de fls. 338/339, Declaração do Diretor de Departamento de Contabilidade da Prefeitura de Macururé de fls. 340 e Nota de Empenho de fls. 341.
Foram apresentadas Alegações Finais na forma de Memoriais pela Coligação Autora às fls. 346/376 e pelas partes Rés às fls. 412/424 e às fls. 426/441.
Após, com vistas dos autos, a ilustre representante do Ministério Público Eleitoral emitiu parecer opinando pela procedência da ação às fls. 445/448.
Vieram-me os autos para julgamento.
É o relatório. Passo a decidir.
Deve-se analisar o pedido à luz da legislação eleitoral aplicada ao caso, em especial a Lei Complementar nº 64/90 e a Lei n.º 9.504/1997.
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral visando o reconhecimento da prática de captação ilícita de sufrágio e de abuso de poder político e econômico, praticados, em tese, pelos Investigados, com a aplicação das cominações legais (cassação de registro ou perda do diploma e aplicação de multa).
Inicialmente, cumpre salientar a normalização processual. O feito foi regularmente instruído, estando isento de vícios ou nulidades, sem falhas a sanar, sendo, ainda, observados, dentre outros, os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Em sendo assim e não havendo preliminares, passo ao mérito.
O ponto chave da presente causa cinge-se em saber se os Investigados praticaram a conduta caracterizadora da captação ilícita de sufrágio e de abuso de poder político e econômico.
Pois bem.
Preceitua o art. 41-A da Lei 9.504/97:
oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999).
A captação ilícita de sufrágio denota a ocorrência de ato ilícito eleitoral, impondo-se a responsabilização dos agentes e beneficiários do evento. Essa conduta estará configurada sempre que ao eleitor for oferecido, prometido ou entregue bem ou vantagem com o intuito de captar voto para campanha eleitoral.
Para o enquadramento dessa categoria legal requer-se então: a realização de uma das condutas típicas, a saber: doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal a eleitor; fim
especial de agir, consistente na obtenção do voto do eleitor; e a ocorrência do fato durante o período eleitoral.
No presente caso, após a análise do conjunto probatório dos autos, constata-se a presença dos três fundamentos para a configuração da conduta ora analisada.
O primeiro fundamento que restou configurado nos autos é a doação, oferta, promessa ou entrega de bem ou vantagem pessoal a eleitor.
É fato incontroverso que a então candidata à reeleição Silma Eliane Adriano do Nascimento Carvalho realizou visita à família da eleitora Iza Alves da Conceição no início do mês de agosto de 2012 com o intuito de obter votos para a sua candidatura. A eleitora, em sua declaração acostada ao processo e no depoimento prestado em audiência, especifica a visita realizada pela Investigada, sendo que esta em sua defesa não refuta a realização da visita, nem a data da sua concretização, rebatendo, apenas, o teor da conversa. Ademais, confirmando o fato existem ainda os depoimentos das testemunhas ouvidas às fls. 155/156 e 170/171.
Outro fato comprovado nos autos é que, após poucos dias da visita realizada pela primeira Investigada, especificamente no dia 13 de agosto de 2012, foi efetuado depósito na conta pessoal da eleitora no valor de R$ 411,75 (quatrocentos e onze reais e setenta e cinco centavos) pela Prefeitura Municipal de Macururé, conforme documento de fls. 18, coincidência esta que causa estranheza e corrobora a versão sustentada pela eleitora Iza, tanto na declaração firmada pelo próprio punho, quanto no depoimento prestado em juízo, sob compromisso.
Com efeito, em sua declaração, afirma a eleitora que foi assediada pela primeira Investigada a mudar o seu voto, já declarado para o candidato da oposição, pois deveria pensar nos seus sonhos e no futuro de seus filhos, já que com a primeira Investigada no poder poderia realizá-los. Para corroborar as suas promessas, a primeira Denunciada teria informado sobre a inclusão do nome da eleitora na folha de pagamento da Prefeitura Municipal de Macururé no mês de junho/2012.
A primeira Denunciada alega, em contrapartida e conforme já mencionado alhures, que a visita foi realizada no intuito de angariar votos licitamente para a sua campanha à reeleição, tendo o depósito sido efetuado por erro de funcionário da Prefeitura, não tendo nenhuma relação com a campanha eleitoral.
E mais, em suas teses de defesa, para justificar o depósito, os Demandados sustentam que a eleitora foi inserida na folha de pagamento da Prefeitura em junho de 2012, para atender o Programa Pró-letramento da Secretaria de Educação, todavia houve “falha” na contratação, pois a mesma não poderia ter sido efetivada pelo estado adiantado de gravidez da profissional.
Sucede que observa-se neste caderno processual que mesmo após essa constatação, novas “falhas” da Secretária de Educação e do Diretor de Administração teriam ensejado o pagamento de salário no mês de agosto de 2012.
Em que pese o esforço perpetrado pelos Defendentes, através de seus brilhantes causídicos, as suas alegações não possuem o condão de desconfigurar a compra de voto, na medida em que, mesmo que inicialmente tenha havido falha na inclusão da eleitora na folha de pagamento do mês de junho/2012, a tese e os documentos apresentados não conseguem justificar o depósito efetuado na conta corrente da profissional dias após a visita da candidata à reeleição à sua residência, precisamente no dia 13 mês do mês de agosto de 2012.
A meu ver, há fortes indícios a indicar que a documentação juntada pelos Investigados para justificar o depósito na conta corrente de eleitora Iza foram confeccionadas para esse fim, não possuindo veracidade suficiente para corroborar com a tese de defesa. Se não, vejamos:
Primeiramente, a eleitora Iza Alves da Conceição foi inserida na folha de pagamento da Prefeitura sem ter sido realizada efetivamente a sua contratação, já que não houve a entrega de documentos nem a assinatura de contrato, tendo sido os seus dados obtidos nos registros do ente público, já que a eleitora havia trabalhado na Prefeitura até o mês de dezembro do ano de 2010, quando foi exonerada por ausência de formação em curso superior.
Verifica-se, em um segundo momento, que o suposto equívoco teria sido constatado pela Secretária de Educação do Município ainda no mês de junho/2012 e pelo Diretor de Administração da Prefeitura no mês de julho de 2012, todavia nada teria sido feito para evitar o depósito na conta corrente da eleitora no mês de agosto!
O Diretor de Administração alega que procedeu ao cancelamento do nome da eleitora da folha de pagamento do mês de julho/2012, conforme depoimento de fls. 167/169, mas que, quanto ao mês de junho/2012, procedeu a uma simples suspensão, fato este que teria ocasionado o pagamento.
Ora, tal justificativa não convence, uma vez que a partir do momento em que se verifica a existência de falha na contratação de profissional que foi incluso em folha de pagamento sem a realização de entrevista, coleta de documentos ou quiçá a realização de contrato, em virtude de adiantado estado de gravidez, espera-se que o seu nome seja imediatamente cancelado da folha para evitar pagamentos indevidos. Principalmente, quando já constatada a ausência de prestação dos serviços pelo profissional.
Dessa forma, causa estranheza o suposto procedimento adotado pelo funcionário da Prefeitura Municipal de Macururé, no cargo há quase 04 (quatro) anos, ao retirar a eleitora da folha de pagamento no mês de julho/2012 e não retirá-la no mês de junho/2012, uma vez que, conforme depoimentos extraídos dos autos, desde o início do mês de junho/2012 já seria de conhecimento da Secretaria de Educação que a eleitora não poderia exercer nenhuma função laborativa em razão do seu avançado estado gravídico.
Assim, não há justificativa plausível para a não retirada da eleitora da folha de pagamento no mês de junho/2012, uma vez que os funcionários da Prefeitura responsáveis pela contratação e inclusão de empregados em folha de pagamento, quais sejam, a Secretaria de Educação e o responsável pela elaboração da folha de pagamento, confirmam em seus depoimentos que sabiam que a eleitora não estava realizando nenhum serviço para a Prefeitura Municipal de Macururé.
Outrossim, é importante mencionar que a folha de pagamento do mês de junho/2012, juntada aos autos pela parte Autora (fls. 77/90), extraída através do sistema TCMBA no dia 01/09/2012 e a folha de pagamento juntada pela parte Denunciada (fls. 290/337), extraída no dia 06/07/2012, possuem divergência em relação aos funcionários contratados pela Prefeitura para suprir o Programa Pró-letramento.
E mais, para comprovar a necessidade de contratação de profissionais para suprir o referido programa da Secretaria Municipal de Educação, os Denunciados juntam aos autos relação de fls. 264, com a indicação dos funcionários que foram contratados em caráter de emergência pelo Município. Todavia, na própria folha de pagamento juntada pelos Denunciados com a data de 06/07/2012 referente ao mês de junho/2012, apenas consta o nome de três das pessoas indicadas naquela relação de fls. 264!
Já na folha de pagamento apresentada pela Denunciante, referente ao mês de junho/2012, extraída no dia 01/09/2012, as pessoas indicadas pela Secretaria de Educação na relação de fls. 264 estão relacionadas como Trabalhadores Temporários.
Vale ressaltar que o Diretor de Administração, responsável pela folha de pagamento, informa nos autos do Processo Administrativo Disciplinar, em petição datada de 16 de agosto de 2012, de fls. 266, que todos aqueles profissionais indicados na relação de fls. 264 foram efetivamente contratados pela Prefeitura.
Desta forma, como é sabido que contratações temporárias não podem ser realizadas pelos entes públicos a partir do período eleitoral, que se iniciou no mês de julho de 2012, todos aqueles profissionais relacionados junto com a Senhora Iza Alves da Conceição deveriam estar normalmente inclusos na folha de junho/2012 apresentada pela própria Prefeitura, causando estranheza que apenas os nomes da eleitora em comento e de dois outros profissionais apareçam no documento datado de 06/07/2012.
Pelo dito, as provas juntadas aos autos revelam que a inclusão da Sra. Iza Alves da Conceição na folha de pagamento dos funcionários da Prefeitura de Macururé do mês de junho de 2012 foi efetivamente realizada com o intuito de justificar o depósito feito na conta corrente da eleitora, após a visita realizada pela primeira Investigada.
Corroborando este entendimento, existem as falhas encontradas em processo administrativo disciplinar de fls. 261/288, juntado aos autos já na fase de diligências pela Prefeitura Municipal de Macururé, instaurado supostamente para apurar as supostas falhas cometidas quando da contratação da eleitora Iza Alves da Conceição.
De fato, no que diz respeito a este Processo Administrativo Disciplinar há algumas considerações a serem feitas:
Inicialmente, em que pese os Denunciados já em suas defesas mencionarem a existência de procedimento administrativo iniciado pelo Controle Interno para reaver o valor indevidamente transferido e responsabilizar o funcionário pela falha, curiosamente não juntam
aos autos qualquer documento para comprovar o alegado nesta fase processual.
Já quando da juntada aos autos do referido processo de nº 001/2012 na fase de diligências, constatou-se a existência de inúmeras falhas capazes de macular a sua veracidade.
São elas: há notificações sem a devida assinatura, não há numeração de folhas, não há protocolos de recebimentos de documentos, não há a observância de requisitos essenciais para a regularidade do procedimento como a necessária publicidade dos seus atos, levando-se à conclusão de que o mesmo foi fabricado para justificar a suposta falha de inclusão na folha de pagamento da eleitora Iza Alves da Conceição e o consequente depósito tardio de quantia sem a prestação laborativa.
Deveras, robustecendo este entendimento, segue trecho do judicioso parecer da Ilustre Representante do Ministério Público Eleitoral:
“O processo administrativo para suposta punição ao servidor que afirmou ter cometido erro de determinar o pagamento indevido é prova produzida unilateralmente e não tem o condão de desconstituir os demais fatos provados e alegados. Isso porque não tem qualquer publicação e não há qualquer formalização, ao contrário, foi produzido para demonstrar que houve medidas por parte da prefeitura. Não é capaz de desconstituir o fato dela ter recebido valor sem ter prestado serviço. É certo que alguma justificativa teria que ser apresentada para aquele valor ser depositado na conta da Sra. IZA.”.
Efetivamente, analisando-se de forma cuidadosa a prova careada aos autos, observa-se a completa ausência de observância dos requisitos essenciais para o desenvolvimento válido e regular do suposto procedimento apuratório administrativo, os quais destacamos:
a) A portaria que instaura o processo administrativo, instituindo a comissão responsável por apurar a suposta falha de funcionário, não traz a indicação da lei que regerá o procedimento e sequer foi publicada em órgão oficial;
b) O parecer conclusivo foi elaborado pela Comissão de Inquérito Administrativo, quando, na verdade, trata-se de atribuição de órgão jurídico da Prefeitura para apuração da legalidade do procedimento;
c) O funcionário investigado compareceu à audiência realizada sem o acompanhamento de advogado ou de servidor que pudesse suprir tal ausência;
d) A decisão administrativa que aplica a pena ao funcionário foi proferida sem o correspondente dispositivo legal; revelando-se nula de pleno direito.
Vale mencionar, por oportuno, que o Princípio da Publicidade é inerente ao regime democrático e abrange toda a atuação dos entes públicos, abrangendo os atos administrativos concluídos ou em formação.
Destarte, a sua aplicação no Processo Administrativo Disciplinar nada mais é que uma consequência fundamental da sua essência de conferir transparência aos atos públicos. Tanto que a instauração de um PAD se dá através da publicação da portaria com a designação da comissão encarregada de proceder aos trabalhos de investigação e de apresentar um relatório final conclusivo sobre a procedência ou não das acusações levantadas.
Assim, além das irregularidades detectadas no suspeito Processo Administrativo, temos que a sua publicização é ato essencial para eficácia e moralidade do procedimento e para a transparência da atuação administrativa. Sem publicização não fluem os prazos para impugnação administrativa ou anulação judicial, quer o de decadência para impetração de mandado de segurança, quer os de prescrição da ação judicial cabível.
Dessa forma, a ausência de publicidade dos atos componentes do Processo Administrativo Disciplinar e as demais falhas apontadas revelam que o mesmo foi forjado pela Administração Pública Municipal para justificar o injustificável, não possuindo o condão de refutar as demais provas apresentadas no decorrer do processo que caracterizam a compra de voto.
À guisa de conclusão, verifica-se que a tese trazida a lume pelas peças de bloqueio dos investigados, no sentido de que o depósito efetuado na conta-corrente da eleitora dias após a visita da primeira investigada à casa da família daquela, em pleno período eleitoral, não teria passado de uma coincidência e de um mero equívoco cometido pelo Setor de Pagamentos, não é o que ordinariamente acontece. Vale dizer, se não é impossível de ocorrer é com toda certeza bastante improvável.
O segundo fundamento configurado nos autos é o fim especial de agir previsto no art. 41-A da Lei 9.504/97.
Alegam os Denunciados a inexistência de dolo específico, qual seja, a intenção de com a conduta captar ilicitamente o voto, pois na declaração acostada aos autos a eleitora afirma que a primeira Investigada teria dito que a ajudaria independentemente de voto.
Para justificar a ausência de dolo, os Denunciados utilizam-se de fragmento extraído do depoimento da eleitora (que os mesmos informam em suas alegações finais ser testemunha suspeita e inidônea) sem levar em consideração todo o contexto da conversa.
É que a eleitora em sua declaração e também no seu depoimento prestado em juízo relata que a Investigada, na visita que fez à sua família, ao pedir o voto ponderou sobre a necessidade da mesma pensar em seus sonhos e no futuro dos seus filhos, pois com a Representada no poder poderia alcançá-los, sem a necessidade de humilhação. Para comprovar o quanto prometia, a informou sobre a inclusão do seu nome na folha de pagamento da Prefeitura. A sua alegação é confirmada através do depósito que foi feito na conta corrente da eleitora.
No caso desse segundo fundamento, o que se exige é que, a partir das circunstâncias do caso concreto, seja possível inferir o especial fim de agir no tocante à captação do voto, qual seja a pretensão de com o ato ou fato, obter o voto, caracterizando o dolo.
Com base no conjunto probatório, percebe-se que a visita da primeira Investigada foi efetuada com o especial fim de captar ilicitamente voto, na medida em que houve não somente a promessa de melhoria de vida em caso de obtenção de voto, como também o cumprimento da promessa com a efetivação de depósito na conta corrente da eleitora no valor de R$ 411,75 (quatrocentos e onze reais e setenta e cinco centavos).
Dessa forma, não se comprovou no presente caso tratar-se de mera “promessa de campanha”, feita de forma geral e indiscriminada, sem aptidão para corromper ou vincular os destinatários. Pelo contrário, trata-se de clara compra de votos específica e endereçada a pessoa certa e determinada, qual seja a eleitora Iza Alves da Conceição.
O depoimento da testemunha Maria de Fátima Lima do Nascimento de fls. 155/156 comprova o especial fim de agir adotado pela primeira Investigada, quando revela:
“Que quando a prefeita esteve em sua casa perguntou à mesma que candidato estava apoiando, ao que respondeu que apoiava Gena, que a prefeita disse então para a mesma pensar bem, que a prefeita disse que se decidisse votar com a mesma que a procurasse.”.
O terceiro fundamento para a configuração da captação ilícita de sufrágio é a ocorrência do fato durante o período eleitoral, conforme ratifica a jurisprudência abaixo:
“[...]. A caracterização da captação ilícita de sufrágio requer que a oferta ou promessa de entrega de benefício ocorra desde o registro da candidatura até o dia da eleição. [...].” (Ac. de 29.6.2006 no ARESPE nº 25.795, rel. Min. Caputo Bastos.)
A incidência desse fundamento também está demonstrada pelas provas carreadas aos autos. Isto porque, ao contrário do quanto alegado pelos Denunciados, a visita da primeira Investigada e o depósito da quantia em dinheiro na conta corrente da eleitora ocorreram em pleno período eleitoral, especificamente no mês de agosto de 2012.
Dessa forma, as provas trazidas aos autos pelos Denunciados, sejam os documentos, sejam os depoimentos das testemunhas indicadas pela defesa, não foram suficientes para afastar a incidência dos fundamentos caracterizadores da captação ilícita de sufrágio.
Saliente-se que as testemunhas trazidas aos autos para comprovar a tese de defesa foram ouvidas na condição de declarantes, pois ocupam cargos de confiança na Prefeitura Municipal de Macururé gerida pela primeira Investigada.
Quanto ao segundo Investigado, o Senhor Renato Soares de Moura, cabe ressaltar que se firmou o entendimento de que para a caracterização da captação ilícita de sufrágio não é necessária a participação direta do candidato nos atos ilícitos, bastando a prova do seu benefício, aliada à demonstração de sua participação indireta, mediante interposta pessoa, ou até mesmo mediante prova de que tenha conhecimento dos fatos e consentido com a conduta.
Nesse sentido, firmou a jurisprudência do TSE:
“Para a concretização da infração do artigo 41-A da Lei das Eleições é desnecessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo candidato, mostrando-se suficiente que, evidenciado o benefício, haja participado de qualquer forma ou com ele consentido.” (Acórdão nº 21.264 – TSE RESPE-28061 de 05/12/07, p. 145.).
“Recurso contra expedição de diploma. Captação ilícita de sufrágio. Abuso do poder econômico. Cassação de diploma. Candidata ao cargo de deputado federal. 1. Caracteriza captação ilícita de sufrágio o depósito de quantia em dinheiro em contas-salário de inúmeros empregados de empresa de vigilância, quando desvinculado de qualquer prestação de serviços, seja para a própria empresa, que é administrada por cunhado da candidata, seja para campanha eleitoral. 2. A atual jurisprudência do Tribunal não exige a prova da participação direta, ou mesmo indireta, do candidato, para fins de aplicação do art. 41-A da Lei das Eleições, bastando o consentimento, a anuência, o conhecimento ou mesmo a ciência do s fatos que resultaram na prática do ilícito eleitoral, elementos esses que devem ser aferidos diante do respectivo contexto fático. No caso, a anuência, ou ciência, da candidata a toda a significativa operação de compra de votos é fruto do envolvimento de pessoas com quem tinha forte ligação familiar, econômica e política. [...]” (Ac. de 24.8.2010 no RCED nº 755, rel. Min. Arnaldo Versiani; no mesmo sentido o Ac. de 16.6.2009 no RO nº 2.098, rel. Min. Arnaldo Versiani.)
Por tudo exposto, resta comprovado nos autos a ocorrência de captação ilícita de sufrágio efetuada por ambos os Investigados contra a liberdade de voto de eleitora do Município de Macururé, ato ilícito com reflexo direto na lisura, normalidade e equilíbrio do processo eleitoral.
Caracterizada a captação ilícita de sufrágio, é importante mencionar que não é necessário ser demonstrada a potencialidade da conduta praticada pelos Investigados, bastando uma só ocorrência de promessa ou compra de voto para configurar o ilícito em exame. Este é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, conforme ementas a seguir transcritas:
“[...]. Cassação. Captação ilícita de sufrágio. [...].” NE: “Ademais, para a condenação por captação ilícita de sufrágio, basta que haja o oferecimento, promessa ou doação de bem ou vantagem em troca do voto do eleitor, com a participação ou anuência do candidato, não se exigindo a demonstração da potencialidade lesiva da conduta ou da significância ou valor da benesse oferecida." (Ac. de 6.5.2010 no AgR-AC nº 76516, rel. Min. Marcelo Ribeiro.)
“Governador. Conduta vedada a agente público e abuso do poder político e econômico. Potencialidade da conduta. Influência no resultado das eleições. Captação ilícita de sufrágio. É desnecessário que tenha influência no resultado do Pleito. [...]. 13. Captação de sufrágio. Não é necessária a aferição da potencialidade da conduta para influir nas eleições. 14. A probabilidade de comprometimento da normalidade e equilíbrio da disputa é suficiente para ensejar a cassação do diploma de quem nessas circunstâncias foi eleito. [...].” (Ac. de 3.3.2009 no RCED nº 671, rel. Min. Eros Grau.).
Seguindo esse mesmo entendimento, José Jairo Gomes, em sua obra “Direito Eleitoral” publicada pela Editora Atlas, 8ª edição:
“(...) cumpre ressaltar que o bem jurídico que se visa salvaguardar é a liberdade do eleitor de votar conforme os ditames de sua própria consciência. É a liberdade de formar sua vontade de votar livremente, escolhendo quem bem entender para o governo. Logo, não é necessário que o evento afete ou comprometa a normalidade ou legitimidade das eleições, porquanto uma só ocorrência já é bastante para configurar o ilícito em exame, sendo desnecessário que haja desequilíbrio das eleições em seu conjunto.”
Dessa forma, no caso presente, o bem juridicamente tutelado é a liberdade do eleitor de formar sua vontade de votar livremente, não sendo necessário demonstrar que o fato teve a capacidade de desequilibrar a disputa eleitoral.
Ao final, não se pode deixar de comentar que a própria captação ilícita de sufrágio é modalidade de abuso de poder, principalmente quando a compra do voto se dá através do uso da máquina administrativa.
Como bem exposto por José Jairo Gomes, em sua obra supracitada:
“É intuitivo que a máquina administrativa não possa ser colocada a serviços de candidaturas no processo eleitoral, já que isso desvirtuaria completamente a ação estatal, além de desequilibrar o pleito - ferindo de morte a isonomia que deve permear as campanhas e imperar entre os candidatos – e fustigar o princípio republicano, que repudia tratamento privilegiado a pessoas ou classes sociais.”.
Haverá abuso sempre que, em um contexto amplo, o poder for utilizado para influenciar, condicionar ou até mesmo determinar o comportamento alheio, através de ações irrazoáveis, anormais, inusitadas ou mesmo injustificáveis, diante das circunstâncias que se
apresentam e, sobretudo, antes os princípios e valores existentes no ordenamento jurídico.
É necessário que a conduta abusiva tenha em vista processo eleitoral futuro ou em curso para configurar o abuso de poder, o que ocorreu no presente caso, já que o uso da máquina administrativa se deu em período de campanha eleitoral, restando cabalmente demonstrado o liame com a campanha política dos Investigados.
Quanto ao pedido de condenação dos Investigados a ressarcir ao erário as importâncias de que foram beneficiários, nos termos do § 7º do art. 73 da Lei 9.504/97, o mesmo não merece ser acolhido, pois as penalidades previstas na Lei n. 8.429/92, especificamente no art. 12, III, devem ser aplicadas em processo específico, da competência da Justiça Federal ou Estadual Comum ou do Distrito Federal, consoante se trate de agente público da União, de Estado, do Distrito Federal ou de Município. Cabe somente à Justiça Eleitoral a suspensão da conduta vedada, que não se enquadra no presente caso, e a aplicação da multa administrativo-eleitoral.
Ante o exposto, em harmonia com o Parecer do Ministério Público Eleitoral, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido formulado na Ação de Investigação Judicial Eleitoral, PARA DETERMINAR, com fulcro no art. 41-A da Lei 9.504/1997, A CASSAÇÃO DOS REGISTROS E DOS DIPLOMAS de Silma Eliane Adriano do Nascimento Carvalho e Renato Soares de Moura e a APLICAÇÃO DE MULTA no valor de cinqüenta mil UFIR, o que equivale à quantia de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil e duzentos e cinco reais), para cada Investigado.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Oficie-se o Presidente da Câmara Municipal de Macururé/BA para assunção imediata do cargo de Prefeito até a realização de novas eleições.
Ciência ao Ministério Público Eleitoral.
Transitada em julgado a presente decisão ou confirmada por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, ficam inelegíveis os Investigados nos termos do art. 1º, I, “j”, da LC 64/90.
Certificado o trânsito em julgado, arquive-se após as anotações devidas.
De Paulo Afonso para Chorrochó/BA, 22 de maio de 2013.
CLÁUDIO SANTOS PANTOJA SOBRINHO
JUIZ ELEITORAL
PROCESSO Nº 322-67.2012.6.05.0158
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL
REPRESENTANTE: COLIGAÇÃO “UNIDOS PARA O PROGRESSO”